ENCONTROS


A diversidade de personagens que cruzam o meu caminho não deixa de me surpreender. E é extremamente útil porque funcionam como uma espécie de disjuntor cerebral quando caio na tentação de olhar os outros com os meus óculos de ver o mundo, que dispara e faz shut down às minhas generalizações e aos meus preconceitos.

Um tipo mal encarado e com pinta de Mafioso russo (de quem eu tentava fugir a sete pés) revela-se um artista francês, viajante e conhecedor do mundo… e da história de Portugal (com excepção daquela parte em que ele teimava comigo que foi o Vasco da Gama que descobriu o Brasil). Uma mulher simples que me parecia pobre e ignorante, revela-se uma verdadeira força da natureza e directora de uma escola, viúva e a fazer malabarismos com a vida para manter 3 filhas na Universidade e ainda por cima era senhora de uma cultura geral brilhante. Um condutor de tuk tuk, dono de um jeito gingão e ar de malandro revela-se um poeta e um espírito curioso (segundo as suas próprias palavras “eu nunca saí de Kisumu e passo umas 15h por dia a conduzir este carro mas conheço o mundo inteiro através das pessoas que se sentam aí atrás”) que me pergunta mil e uma coisas até chegarmos ao meu destino e que até já me fez explicar-lhe no meio do trânsito, com laranjas, como funciona o movimento da terra porque não entendia porque é que no Norte do mundo o Sol demorava mais a pôr-se e havia mais horas de luz em certas alturas do ano.

Ninguém é o que parece, ou pelo menos, ninguém é só o que parece e eu estou em crer que este disjuntor devia ser implantado em toda a gente. Se é verdade que todos temos tendência a fazer generalizações e que ninguém está livre de preconceitos, ao menos que tenhamos um sistema de alerta integrado para podermos reformular, reaprender e reolhar os outros. E isto acontece também no sentido inverso, obviamente. A maioria das pessoas que me vai conhecendo por cá pensa que todos os Portugueses são adeptos de futebol, liberais, opinativos, bem dispostos, pouco amigos das manhãs… simpáticos (porque só me conhecem a mim) e que Portugal é o lugar mais interessante do mundo (vários manifestam vontade de imigrar para lá, um dos meus taxistas favoritos quer que a filha vá para lá estudar, enfim se eles soubessem…). E assim vamos perigosamente construindo as imagens que temos uns dos outros sem mecanismos de alerta que nos ajudem a ver e a apreciar a singularidade.

E depois faz-me confusão, num mundo extraordinariamente diverso e rico haver quem queira viver num mundo só com uma cor, uma língua, uma religião, uma forma de estar, um pensamento único. Nunca ninguém lhes ensinou que os ecossistemas são mais resistentes e adaptáveis quanto maior a diversidade que integram? E é muito difícil vivermos todos juntos, sem dúvida, mas a alternativa…. Não me parece um lugar minimamente interessante e capaz de me vai tornar numa pessoa melhor.

2 Respostas

  1. Muito bem maninha…daqui a nada vou estar aí a testemunhar pessoalmente algumas dessas “histórias”!beijinhos

  2. Belo retrato da diversidade e da forma como vemos o mundo… o grande problema, como dizes, é que muitas pessoas dificilmente têm de lidar com situações de diversidade e por isso, o preconceito e as ideias preconcebidas permanecem, transmitem-se e alastram…

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