Para a Catarina que faz seis anos hoje
A festa de aniversário acabou e estava na hora de ir dormir. Tinha sido um dia cheio de surpresas e coisas boas. Mal a Catarina deitou a cabeça na almofada adormeceu, de tão cansada que estava depois de passar o dia a correr, a brincar, a abrir prendas e a comer coisas boas. Mas passado pouco tempo e apesar do cansaço, começou a sentir frio e acordou. Os cobertores tinham levantado voo e esvoaçavam de um lado para o outro do quarto. Ela não achou piada nenhuma. Tinha sono e frio e queria dormir e por isso mal um dos cobertores passou perto dela, agarrou-o com força para o obrigar a voltar para a cama. Mas qual quê? O cobertor ganhou ainda mais velocidade e quando a Catarina deu fé voava também pelo quarto fora sem conseguir pôr os pés no chão até que, de repente, o cobertor pairou sobre a cama e caiu atirando com ela para o colchão.
– Cobertor, pára quieto! Quero dormir! – disse-lhe a Catarina muito séria a ver se ele se deixava de brincadeiras.
“Parabéns a você! Parabéns a você!…” Alguém cantava no quarto com uma voz linda, muito suave e alegre. Mas, estranhamente não se via ninguém. A Catarina, sentada no meio da cama, olhava de um lado para o outro a tentar perceber de onde vinha aquela vozinha, mas não via nada.
– Ei! Estou aqui em baixo, sentada no teu joelho, olha para mim! – gritou a vozinha.
Era uma linda fada, das que voam e são pequeninas, com um vestido azul comprido que esvoaçava quando ela voava e os cabelos loiros muito compridos.
– Catarina, sou a tua fada dos sonhos e hoje estou aqui por um motivo muito especial – disse ela com ar divertido.
– Uma fada! Que fixe!… Onde está a tua varinha de condão? – perguntou a Catarina intrigada.
– Isso já não se usa, miúda! Andas a ler contos de fadas muito antigos. Agora o que está na moda são os sopros de estrelas. Eu sopro na tua direcção e atiro-te com milhares de estrelinhas à cara para fazer cumprir os teus desejos – informou a fada.
– E posso pedir o que eu quiser!? – diz a Catarina a bater palmas de contente.
– Não! Nada disso! Hoje é um dia muito especial, fizeste seis anos. E todos os meninos, na noite em que fazem seis anos são visitados pela sua fada dos sonhos para escolherem um super poder.
– E posso escolher o que eu quiser?
– Não! Nada disso! Hoje vais experimentar cinco super poderes durante a noite e de manhã, antes de acordares, vais ter de escolher um que vai ficar contigo para sempre e fazer de ti uma menina muito especial – disse a fada enquanto batia as asinhas delicadas e puxava os cobertores para cima da Catarina para ela adormecer.
A fada dos sonhos soprou e atirou com milhares de estrelinhas para o ar. A Catarina fechou os olhos e começou a ver-se no recreio da escola a brincar com os amigos. A fada segredou-lhe ao ouvido que o primeiro super poder que ela ia experimentar era a super força. Ia ficar tão forte que podia levantar as árvores só com uma mão. Então, ao fundo, começaram uma zaragata. Um grupo de meninos começou a empurrar e a bater em outros meninos que brincavam sossegados. Era hora de a super Catarina entrar em acção. Atravessou o recreio a correr e quando chegou perto do grupo agarrou nos braços dos dois meninos mais fortes que estavam a bater nos outros e muito zangada começou a girar com eles à volta e atirou-os ao chão. Só que ela tinha mesmo muita força e não estava habituada por isso quando os largou, os infelizes meninos voaram para tão longe que quando caíram no chão partiram três costelas, dois dedos, quatro dentes e não paravam de chorar. Enquanto todos batiam palmas à Catarina por ela ter sido tão forte e corajosa e por os ter defendido ela correu para os dois miúdos e começou a chorar quando viu que os tinha magoado tanto.
Nessa altura chegou a fada dos sonhos, voltou a soprar-lhe estrelinhas e segredou-lhe ao ouvido que o segundo poder ia transformá-la na menina mais inteligente do mundo. A Catarina estava então na sala de aula e a professora, mais à frente, ensinava muitas coisas novas. Sempre que ela tentava ensinar algo novo, enquanto todos os meninos ficavam entusiasmados por aprender, a Catarina dizia logo “Eu sei, eu sei, posso ir mostrar como se faz?” e passado pouco tempo os colegas já não a suportavam. Ela sabia tudo, não os deixava aprender, mais ninguém falava na aula e a professora já não sabia o que lhe havia de fazer. No fim do dia, a própria Catarina estava muito triste. Os outros meninos já não gostavam dela e ela já não gostava da escola porque era aborrecido não haver nada para aprender, não haver nada de novo.
Então a fada dos sonhos chegou, soprou-lhe estrelas mais uma vez e disse-lhe que o terceiro super poder ia permitir-lhe voar. Desta vez, na praia, a Catarina feliz da vida abre os braços, corre e levanta voo. As pessoas que a viam nem queriam acreditar. Como era possível uma menina voar assim? Que maravilha! E ela ria e ganhava cada vez mais velocidade com os cabelos a esvoaçar ao vento e acenava para as pessoas que na praia a olhavam maravilhadas. Foi então que de repente sentiu uma bicada na testa, uma grande confusão de penas e se desequilibrou. Distraída, sem estar habituada a voar e sem conhecer as regras de trânsito dos pássaros tinha atropelado um grupo de gaivotas que iam sossegadas a caminho do seu rochedo no meio do mar. Com o acidente e a atrapalhação, ouviram-se muitos gritos, soltaram-se muitas penas e a Catarina caiu estatelada no areal.
A fada dos sonhos aparece de novo e diz-lhe que o super poder seguinte ia fazer dela a menina mais doce do mundo, pois tudo em que tocasse ficava doce. Na cozinha, o pai prepara-lhe uma linda torrada com azeite e sementes de mostarda, mesmo como ela gosta e quando a Catarina pega nela e mete à boca começa a torcer o nariz porque lhe sabia a chocolate. A seguir vem para a mesa um belo rolo de carne, mas mal o mete na boca fica a saber a caramelo. Tudo o que ela experimentava fica a saber a doces e pelo fim do jantar já estava enjoada.
Mais uma vez, e agora a última, a fada dos sonhos chega ao pé dela, sopra-lhe estrelas e segreda-lhe ao ouvido que o quinto super poder a vai transformar na menina mais rápida do mundo. A correr a Catarina é mais veloz do que ninguém. Na escola a professora dá inicio a uma corrida e a Catarina sai disparada, mal se vê e atravessa a meta toda contente. Depois senta-se à espera que os outros cheguem, o que só acontece muito tempo depois. Na praia, a brincar com outros meninos, acontece o mesmo, chega sempre muito mais depressa que os outros e depois fica sozinha à espera. Até entrou num concurso e fez a mesma corrida vinte vezes só para não ficar sozinha mas depois também se cansou de chegar à meta e voltar ao início, e chegar à meta e voltar ao início e chegar à meta e voltar ao início e acabou por ficar, como sempre, à espera dos outros e nem sequer estava feliz por ter ganho porque já sabia que ganhava sempre.
Então a fada dos sonhos voltou, fez-lhe cócegas no nariz para ela acordar e perguntou-lhe com que super poder queria ficar. A Catarina sentou-se na cama ensonada e começou a pensar em voz alta.
– A força, não quero. É muito perigoso e posso magoar os outros meninos. A inteligência também não pois não tem piada nenhuma saber tudo; é bom aprender. Voar também não quero. É muito bom mas o céu é para os pássaros e podem haver muitos acidentes. A doçura enjoa e eu gosto de todos os sabores, não quero passar a vida a comer coisas doces, tudo com sabor a chocolate, caramelo, chantily… não, quero os sabores todos. E também não quero a rapidez. É aborrecido saber que vamos ganhar as corridas todas e não gosto de ficar sozinha à espera de toda a gente.
– E então não vais querer nenhum super poder? – perguntou a fada dos sonhos muito intrigada.
– Não! – disse muito séria a Catarina – Não quero ter super poderes, pensava que era mais divertido.
– Então vais ter de descobrir os teus próprios super poderes, aqueles que nenhuma fada te pode dar e que mais ninguém tem – disse a fada a sorrir para ela.
– Mas eu tenho super poderes? – perguntou a Catarina.
– Claro que tens, muitos. Toda a gente tem super poderes. Só tens de os descobrir. Tens de confiar em ti e descobrir os super poderes que fazem de ti uma menina tão especial, diferente de todas as outras. Tens de descobrir a Super Catarina.
E então a fada bateu as asinhas novamente e puxou os cobertores, soprou mais estrelinhas e disse baixinho “Bons sonhos e feliz aniversário!”.
Minha linda, mais duas belas histórias, como sempre. :)Gosto particularmente desta “Super Catarina”, história tão singela e tão bonita, a condizer lindamente com meninas de seis anitos. 🙂
… de lágrima no olho escrevo, ou tento … Obrigado Gabriela !!!Vou imprimir e contar à minha Catarina para que todos os dias que esteja com ela sejam o seu “aniversário” para que a vida lhe seja leve e feliz.Este teu “super-poder” vai emergindo mais e mais…Abraço Luis
Que doçura! Que maneira privilegiada de começar o dia! Quase apetece voltar a ter 6 anos. Obrigada.BeijoTão
Tu tens o Super poder de escrever!beijinho
Sarinha,Olha lá, quem diria? eu a escrever literatura infantil :)… ai as voltas que a vida dá!LuísAi, que pai babado… tão querido. Não te esqueças de lhe fazer as vozes diferentes dos personagens. Tu lê-lhe a história como deve ser! :)TãoTás a ver? Não é mais bonito que dizer “anónimo (a)” :)Eu sou um doce… mainada!BeijinhosMartaUmmmmm quero acreditar que sim… mas tenho mais super poderes, ai tenho, tenho 🙂 e uns quantos que ainda nem descobri.
Infelizmente não conheço nenhum editor. Mas não há nada a perder se conseguires um dia publicar!A “Super Catarina” não deve ser difícil de adaptar ao Teatro. Vou pensar nisso… É uma coisa a pensar sériamente… Bom fim de semana!
LívioEstás contratado! Vais ser o meu agente literário :).Pois olha que eu já trabalhei uns anos largos numa editora e talvez por isso mesmo encaro com certo desprezo a possibilidade de publicar. Fartei-me de ver coisas boas a irem parar ao lixo pq não vinham recomendadas por ninguem famoso e porque os autores eram desconhecidos. Da mesma forma que tive de trabalhar com autores mediocres armados em divas e com textos maus reverenciados por terem sido escritos por gente “famosa”. Também me fartei de ver a editora pôr a máquina comercial a promover porcarias e a ignorar trabalhos bons pelos mesmos motivos. E até conheço mais gente no ramo… só que infelizmente a lógica é a mesma. Há editoras mais pequenas, é certo, com critérios menos comerciais… um dia destes vou tentar… por agora prefiro experimentar, amadurecer…Gostei da ideia de adaptar o conto ao teatro… a história a ganhar vida… a chegar a mais gente, isso sim, eu gostava! Pensa nisso a sério :)Abraço e bom fim de semana!
Miss A.Ainda não li estas duas histórias, MAS VOU!Desta vez vim até aqui porque tens um desafio no meu blog. Só aceitas se quiseresBeijinhos
Parabéns para a Catarina!! Seis anos?? Já ninguém tem 6 anos…beijos felizes
Foi mesmo o que pensei quando li o teu conto:”não deve ser difícil de adaptar ao Teatro” e escrevi-o!Agora, depois do que escreveste, formou-se outra ideia na minha cabeça! Neste momento, faço parte do elenco que vai estrear uma peça dia 17, e até lá, tento concentrar-me totalmente nisto. A peça é dificil e precisamos de todas as energias.Não sou “expert” mas já adaptei 2 ou 3 pequenos contos e uma peça antiga cujos textos eu próprio encenei.Já imprimi o teu conto, irei lê-lo mais vezes e depois da estreia vou tentar fazer a adaptação.Há algum tempo que estou matutando em fazer algo de diferente no Teatro. Estou um pouco cansado (eu e os outros dois do elenco não paramos desde Setembro 2006) e já tinha decidido parar depois desta peça e repensar até Janeiro o que irei fazer. Quem sabe se o teu conto não será o ponto de partida para o que quero (há uma luzinha lá no fundo a formar-se…).Nada prometo, mas tentar vou concerteza!
Gente boa,O teste da exigente apreciação crítica de uma criança foi ultrapassado. E o narrador era eu… 🙂 hehehehhe, que apesar dos meus melhores esforços e afectos, estou certo que outros ( um bom profissional ) poderiam fazer muito melhor.A história é mesmo muito boa !!!!!! Com uma boa ilustração é uma super história !!!!Lívio, como sabes não há muito teatro para crianças ( mais ainda bom …). E se nos dissesses onde vai estrear essa peça ?… A Catarina gosta imenso de teatro…Abraço Luis
Miss A,Desta vez vim ler a história ;)Que dizer? Muito doce, é o que tenho para te dizer.Beijinhos
Miss A. mas tu és hospedeira? Andas sempre a viajar, que raio? lol Vê lá se descansas porque eu quero que desenhes um belo comentário no meu último post. Desculpa lá se te deixei zonza,não era nada pessoal ;)kisses
Neste momento não é peça infantil(Luis) mais vai estrear já sábado 17. Podem ver no meu blogue!Mas como aqui disse de seguida vou-me atirar a este belo conto, ai vou!Veremos!
…boa Lívio !!!! Força !!!!Se puderes mandar o link do teu blogue eu espreitava…AbraçoLuis
African Queen desculpa esta troca com o anónimo Luis- thedaysafterfifty.blogspot.comBom fim de Semana!
Gaja Boa 1Eu sinto-me com seis anos muitas vezes :)Beijinhos!AlienEu já respondi aos teus desafios, já fiz comentário e tudo e tudo e tudo… tás a ver? Sou um doce mesmo :), como o conto!LuísDeixa o Lívio trabalhar sossegadito que a peça dele estreia hoje 🙂 Qd ele tiver tempo ele vai ver o que fazer com a super Catarina.BesitosLívioO anónimo Luís é muito conhecido meu e podes falar com ele à vontade como se eu não estivesse aqui. Têm a minha benção! :DMais uma vez bom trabalho e muita energia para a nova aventura que estreias hoje.Beijinhos com sorte
…hehehehehehe….e esta ?!…:)…”muito conhecido”… hehehehe…aí está um bom mote para uma boa história para a infancia e juventude ( dos 7 aos 77 ou 99 nos dias que correm )…African Queen,…muito conhecido ?!…Volta, estás perdoada !!!!Abraço LuisPS: Obrigado Livio e agora que temos autorização da minha “muito conhecida” AQ, vamos falando
Adorei esta história! Bonita e ensina uma boa moral!!!! Gostei imenso. parabensbjs
É capaz de ser um projecto demorado, mas já tive conversas, outras pessoas já tiveram ideias e começa a tomar forma na minha cabeça! Vamos ver as possibilidades, com tempo!